terça-feira, 23 de junho de 2015

CMDCA acusa conselheiro tutelar de negligência no caso do menor S.M.S

 (Marcus Ottoni - texto | foto: arquivo blog)

  O Conselho Municipal de Defesa da Criança e Adolescente (CMDCA), acusa o atual presidente do Conselho Tutelar de Valparaíso, Gilson Araújo Freitas, de “negligência e abuso de autoridade” no atendimento ao menor S.M.S., de 3 anos, que faleceu vítima de problemas de saúde,  no último dia 7 de março, após um ano de assistência por parte do Conselho Tutelar.
Oficio do secretário cobrando investigação
  De acordo com a denúncia formalizada pelo CMDCA em documento encaminhado ao Ministério Público, o presidente do Conselho Tutelar teria sido omisso no atendimento e acompanhamento do menor após a primeira internação de S.M.S na Unidade e Pronto Atendimento da UPA 24h, em abril de 2014, com suspeita de violência doméstica, maus tratos e abuso sexual  (leia texto no final dessa reportagem).
  Já o conselheiro Gilson Freitas identifica uma “guerra pelo poder” capitaneada pelo atual secretário municipal de saúde, Walter Matos, cuja irmã é um dos cinco conselheiros com atuação no Conselho Tutelar do município e desafeta do presidente na entidade. Ele afirma que procedeu de forma adequada no caso do menor S.M.S. em total concordância com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e em perfeita sintonia com as atribuições de um conselheiro tutelar.
  A “guerra” entre o CMDCA e o Conselho Tutelar é recheada de acusações de ambos os lados e teve início com o aparecimento do caso do menor S.M.S. suspeito de sofrer maus tratos e abuso sexual ao ser atendido na UPA 24h, há pouco menos de um ano. O relatório referente ao atendimento do menor assinado pela diretora da Unidade de Pronto Atendimento, doutora Ana Carolina Bezerra de Almeida, revela o ocorrido na UPA 24h até a transferência de S.M.S. para o Hospital Regional de Ceilândia, em Brasília, e foi parar nas mãos do secretário municipal de Saúde, Walter Matos, que, em ofício classificado de “urgente” pediu providências a então secretaria municipal de Promoção Social, Creuza Pereira Gois. 
  A documentação foi encaminhada ao Ministério Público, para o gabinete da promotora Oriane Graciane de Souza, pela secretária Creuza Pereira e foi instaurada uma comissão de inquérito pelo CMDCA para analisar e apurar os fatos junto ao Conselho Tutelar. A Comissão de Inquérito promoveu a coleta de depoimentos e oitivas de todos os servidores, da equipe multidisciplinar e dos conselheiros do órgão. Apenas o presidente do Conselho Tutelar, Gilson Freitas se recusou a prestar depoimento à comissão, cujo trabalho teve o acompanhamento da Procuradora da Prefeitura, doutora Rivania.
  O relatório da comissão serviu de base para o pedido da cassação do mandato do conselheiro Gilson Freitas na Justiça pela confirmação, segundo o documento, de “negligência e abuso de poder” constatado nos depoimentos de todo o pessoal que atua no Conselho Tutelar. Segundo a presidente da comissão de inquérito, Marilene de Almeida, e a presidente do CMDCA, Alzinete Silva, o atual presidente do Conselho Tutelar, Gilson Freitas, está com o mandato cassado e atua com base numa liminar concedida pela Justiça.
  Uns cem números de documentos assinados por diversos profissionais que atuam na área da saúde pública e em colegiados municipais fazem parte do dossiê do caso S.M.S. Em todos eles, produzidos durante o ano de 2014 desde a primeira internação do menor, apontam a negligência como fator principal para o estado critico da saúde de S.M.S. e indicam a necessidade de acompanhamento conforme determina o Estatuto da Crianças e do Adolescente (ECA- Lei 8.069/1990).
  Um exemplo é o relatório social do Centro de Referência Especializado de Assistência Social da Prefeitura (CREAS), datado de 18 de setembro de 2014, que investigou a situação da família de S.M.S. a pedido do CMDCA, atendendo uma solicitação de providências feita pela secretária de Promoção Social, Creuza Gois, via ofício no dia 11 do mesmo mês. O parecer reforça a tese da negligência dos pais com o menor e alerta para a necessidade de “acompanhamento por parte dos órgãos de proteção à criança, com vistas a viabilizar a segurança e o desenvolvimento de S(...) e de seus irmãos”.
  Enquanto a “guerra” entre o CMDCA e o Conselho Tutelar acontecia na área burocrática, a saúde da criança piorava e todo atendimento realizado, segundo a madrasta do menor, Maria Sonia da Silva Santos, ficou a cargo do Conselho Tutelar na responsabilidade do conselheiro Gilson Freitas. Ela diz que não tinha acesso ao tratamento do enteado porque tudo era resolvido pelo conselheiro. “Não houve tratamento porque eles não me deram nem atenção, vão me dizer alguma coisa? Não estavam passando nada para mim, não. Não estavam me dando informações, como é que eu vou dizer?”, desabafa Maria Sonia.
  S.M.S.  faleceu no início do último mês de março, quase ano após ser internado pela primeira vez na UPA 24h em Valparaíso de Goiás. O laudo aponta como causa da morte: choque séptico; pneumonia; desidratação e desnutrição. Ele foi atendido no HMIB, em Brasília, onde morreu. Foi registrado um boletim de ocorrência na 2ª Delegacia de Polícia de Valparaíso de Goiás, pela presidente do CMDCA, Alzinete Silva, com alegação de agressões físicas e maus tratos sofridos por  S.M.S , reforçando a negligência do Conselho Tutelar na proteção do menor. 


Gilson rebate acusação do CMDCA e revela “guerra pelo poder”

  
  O presidente do Conselho Tutelar de Valparaiso de Goiás, Gilson Araújo Freitas, rebate todas as acusações do CMDCA relacionadas com sua atuação no caso do menor S.M.S.. Para ele o menor foi e ainda  está sendo usado para mascarar uma “guerra pelo poder” direcionada pelo atual secretário municipal de saúde, Walter Matos, para desacredita-lo e denegrir sua atuação como conselheiro. A irmã de Walter Matos, Carla Matos, é conselheira do Conselho Tutelar e mantém uma relação conflituosa com Gilson na entidade.
 Ele diz que todos os procedimentos adotados por ele no caso S.M.S. estão em concordância com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e que fazem parte da postura dos conselheiros do Conselho Tutelar. Para ele quem cometeu erros e extrapolou suas atribuições foram os funcionários da saúde municipal que não teriam competência para determinar procedimentos que foram feitos quando da primeira internação de S.M.S. na UPA 24h.
  Em um documento encaminhado por ele para os profissionais de saúde da UPA, sem data e com o titulo de “Comunicado”, Gilson afirma que há negligência por parte dos pais do menor, mas que não existe qualquer comprovação de agressões física e abuso sexual, o que contraria o “juízo antecipado” feito pelos profissionais que atenderam o menino, gerando procedimentos errados na condução do caso. Ainda no documento, Gilson cita o comportamento inapropriado do uso de “ameaças” a madrasta do menor o que caracteriza desrespeito ao Conselho Tutelar, que possui autoridade para decisões emergenciais com relação a crianças e adolescentes, mas jamais confundido “como agente policial ou acompanhante hospitalar”. “Eles agiam intempestivamente, agiam como fosse dar ordens ao Conselho Tutelar, o que já me indignou ali e que já vinham de uma situação armada”, afirma o conselheiro.
  Gilson diz que o “pessoal da saúde” foi o responsável pela hostilização sofrida pela madrasta de S.M.S. o que causou graves prejuízos emocionais para ela, já que, segundo ele,  as suspeitas de agressão física, maus tratos e abuso sexual, foram transformadas em fatos concretos com a condenação antecipada dos pais do menor. Ele lembra que as fotos de S.M.S. foram espalhadas e que as viu no próprio celular do secretário municipal de Saúde, Walter Matos, que o perguntou se aquelas imagens não configuravam agressões e maus tratos.
  O conselheiro diz que a própria Justiça comprovou a não existência de agressões e maus tratos, mantendo a criança sobre os cuidados dos pais na mesma residência. Ele diz que o caso de negligência ocorria pelo desconhecimento da madrasta dos problemas de saúde do menino e as restrições impostas pelas doenças. “Não havia negligência em outro sentido. Era por puro desconhecimento dos problemas de saúde de S.M.S.”, diz.
  Gilson Freitas atua no município como conselheiro tutelar há dois mandatos. No primeiro, era suplente e assumiu a vaga deixada pelo titular. No atual mandato, foi eleito pela comunidade e assumiu a presidência no ano passado e deve permanecer no comando do Conselho Tutelar até o mês de junho, continuando na função de conselheiro até a posse da nova gestão em janeiro de 2016, caso não consiga se reeleger este ano.
  Ele considera “prejudicial para todo mundo”  o movimento contra ele. “Essa guerra contra o conselheiro Gilson começou depois que eu tomei posse como presidente do Conselho Tutelar. Isso ficou bem claro para todo mundo”, revela. Para ele, a instituição Conselho Tutelar é um órgão autônomo sem subordinação a qualquer outra instituição. “O Conselho Tutelar não é subordinado nem ao juiz. O Conselho Tutelar é autônomo e encarregado pela sociedade para zelar pelos direitos das crianças e dos adolescentes”, frisa Gilson.

 

S.M.S. vivia com a madrastra, o pai biológico e quatro irmãos

  
 O menor S.M.S. nasceu no estado do Piaui, em Teresina, no dia 22 de fevereiro de 2011. Ele era filho de Sônia Maria Mendes da Silva e Marcondes Mendes da Silva. A mãe morreu e o menino passou a ser criado pela madrasta Maria Sonia da Silva Santos e o pai biológico. Ele era irmão de quatro crianças, uma delas filha do primeiro casamento do pai, como ele.
  S.M.S. chegou em Valparaíso de Goias com a família no início de 2014. Era uma criança com saúde debilitada e foi internado na UPA 24h, em abril do ano passado, quando foi identificado um estado critico de desnutrição e um quadro clínico de “emagrecimento, abdome globoso, fígado palpável, membros inferiores ressecados com edema, cabelos quebradiços, pele hipocorada e movimentos com dificuldade”.
  Durante todo o ano de 2014 e o início de 2015, S.M.S. tornou-se foco de um conflito entre o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA) e o Conselho Tutelar. Em março deste ano, depois de apanhar uma gripe junto com seus irmãos, foi encaminhado para um hospital em Brasília aonde veio a falecer. A causa da morte anotada no laudo médico aponta para choque séptico, pneumonia, desidratação e desnutrição.

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